A canção lançada em 1986, na composição de Renato Manfredini Junior, o popular Renato Russo, sob o título “Indios”, não se referia na época ao período de colonização do Brasil, como a grande maioria de suas composições ainda hoje o corresponde a uma maneira ingênua de pensar o futuro do país, que naquele momento era ludibriado pelos governantes.

Falar de futuro compreende poucas certezas, mas após uma ruptura em nossos modos de ser e estar no mundo diante da atual condição da sanitária mundial, nos impõe uma revisão de projetos e expectativas. São muitos sentimentos confusos e cicatrizes que nos deixam pistas do que está por vir.

O tempo do calendário é lembrado na história por suas marcas mais expressivas, o momento que vivemos poderá ser o primeiro marco na humanidade registrada com ênfase nos livros, como um evento histórico marcador do início do século XXI.

O futuro é uma construção elaborada que, neste caso, deve demorar a se organizar. Algumas projeções possíveis são elaboradas por estudiosos e especialistas que tem como ponto de partida o medo.

O trabalho remoto e a educação a distância, comprometem nossas relações e a convivência. Há coisas impossíveis de serem substituídas pelo contato humano, o abraço e até as calorosas discussões já não são as mesmas sem o corpo a corpo. O ambiente social é parte importante de nosso desenvolvimento, como saber lidar com as diversidades promovidas na interação com o outro. Um aspecto importante é que conviver com as diferenças consiste em polir nossas arestas para um caminho menos egoísta o que fortalece nossa capacidade de superação e resolução de conflitos.

No ambiente das redes há uma pressão da opinião pública sobre as empresas, para que sejam mais responsáveis socialmente, mas é importante que essa transformação seja suficiente para a revisão nas leis e no desenvolvimento humano perene.

… Que o mais simples fosse visto como o mais importante …

Instaurou-se uma revisão dos hábitos de consumo com uma maior adesão e visibilidade do minimalismo (menos é mais).  Mas até que ponto estes hábitos permanecem enquanto prática e não modismo?

A exclusão social daqueles que não dominam minimante as tecnologias é também uma questão a discutir, afinal os menos favorecidos pela economia unem-se aqui aos nossos idosos, que muito contribuíram e ainda podem contribuir conosco com sua sabedoria e experiência.

Espetáculos e shows online, com pouca ou nenhuma interação humana, são marcadores de um distanciamento social e econômico. No início deste contexto, muitos artistas tiraram férias enquanto muitos fãs morriam de fome ou de tédio. Em pouco tempo, os mais famosos voltaram com a forca de seus altos recursos, não é difícil imaginar a atitude dos fãs que sobreviveram.

Com o distanciamento social os espaços abertos para o consumo de alimentos e outros entretenimentos oferecem um efeito de sentido de liberdade e retorno a normalidade, mas preocupa pela segurança;

A expansão da compra on line e Delivery é uma “mão na roda” e torna a vida cada vez mais pratica, beneficiada pela tecnologia mas também admite um aumento nos golpes.

…Quem me dera ao menos uma vez

Provar que quem tem mais do que precisa ter

Quase sempre se convence que não tem o bastante

Fala demais por não ter nada a dizer

Mas nos deram espelhos

E vimos um mundo doente…

Os espelhos que nos trouxeram tornaram nossas terras exploradas e nosso povo escravizado e maltratado.

Consegue relacionar este fato histórico com o momento atual?

O que temos feito por nossos idosos e pelos mais necessitados?

Relacionando esse verso da canção, voltamos a dizer que as pessoas apenas olham para si, se preocupam apenas consigo mesmas. Para Renato Russo, as pessoas estão cada vez mais egoístas e nada empáticas e, assim, o mundo vai ficando ruim e doente. Não se trata aqui do espelho que nos faz ver e enxergar, mas daquele que reflete nossas próprias querências e prazeres individuais. Pode parecer um olhar pessimista da parte desta que lhe escreve, mas não se engane, é necessário pensar e discutir para encontrarmos as melhores soluções ao encarar nossos próprios medos.

…Tentei chorar e não consegui.

No último verso, o poeta revela uma sociedade machista, que sente medo de revelar sua sensibilidade. Na contramão disso gostaria de dizer que homem chora sim! Meninos capazes de expressar seus sentimentos são também capazes de expor as falhas e faltas de sua humanidade, somente assim, nos reconhecendo é estabelecemos nossa própria identidade.

Já nos dizia Platão que “todo ser humano carrega em si a pré-disposição para gostar de algumas coisas e rejeitar outras, a educação deveria existir para gostar daquilo que nos faz crescer e rejeitar o que nos faz retroceder a condição animal”. Talvez seja esta nossa oportunidade de aprender a gostar das nossas qualidades humanas, que não menores nem maiores, apenas qualidades. Gostar de si e gostar do outro é uma maneira de pensar o futuro com empatia e de maneira mais fraterna.